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EUREKA, EUREKA! O CRIADOR DA CIÊNCIA

Ísis Vieira Fernandes − Matemática, UFCG

isisvf11@gmail.com

Programa de Educação Tutorial (PET) – Matemática e Estatística

É possível que você já tenha conhecimento sobre um proeminente matemático da Grécia Antiga que, em determinado momento, correu despido pelas ruas da Itália expressando sua euforia com gritos de “eureka, eureka!” Caso ainda não saiba muito a respeito deste homem, este texto permitirá um breve conhecimento acerca deste importante matemático e, por conseguinte, uma compreensão sobre as circunstâncias que levaram à esta conduta.

Com o intuito de não manter o leitor em suspense, vamos falar sobre Arquimedes de Siracusa, matemático que é reconhecido por muitos como o criador da Ciência e, até mesmo, como o maior matemático da antiguidade. Arquimedes nasceu em Siracusa, colônia grega na ilha de Sicília, sul da Itália, por volta do ano 287 a.C. De acordo com o historiador bizantino Joannes Tzetzes, ele viveu cerca de 75 anos. Arquimedes era filho de Fídias, um astrônomo, e fazia parte de uma família nobre. Desde a sua juventude, Arquimedes demonstrou grande habilidade para a matemática e foi em Siracusa que ele realizou a maior parte das suas descobertas e invenções que transformaram a ciência e a tecnologia em sua época.

Depois de anos se dedicando e estudando na sua cidade natal, Arquimedes decide ir para o Egito aprofundar seus conhecimentos junto a outros grandes estudiosos na Alexandria, como Eratóstenes e Conon de Samos, que se tornou seu professor. Eles estudavam num palácio ou museu onde os maiores sábios da antiguidade viviam, trabalhavam e ensinavam.

Ao retornar a Siracusa, Arquimedes se dedicava exclusivamente às suas descobertas, e um dos colegas que ele gostava de discutir sobre o assunto era o rei Hiero. Em um certo dia, Arquimedes comenta para Hiero, o seguinte:

“Na realidade, eu fiz um cálculo rigoroso e não há peso, onde quer que esteja, que não possa ser movido se uma força suficiente for aplicada a ele … Se eu tivesse uma outra Terra onde pudesse me apoiar, conseguiria mover a própria Terra.” (BENDICK, 2006)

Hiero ri do que foi dito e em seguida propõe um desafio ao Arquimedes, se ele conseguisse mover sozinho um navio que ele mandou construir com três mastros, Hiero acreditaria na sua teoria. Foi daí que Arquimedes, curvou-se ao rei, aceitou o desafio e no dia marcado, na frente de uma multidão que o zombava, colocou uma série de cordas, rodas, uma hélice ligada ao navio a na doca, e usando apenas uma mão, girando uma manivela, conseguiu mover o navio que nem a força dos escravos do rei conseguiam mover. Assim, Hiero ordenou que a partir daquele dia Arquimedes deveria ser acreditado em tudo que dizia.

Mas e a história de Arquimedes sair correndo nu na rua gritando “eureka!”, como isso aconteceu? Ela se inicia também com o rei Hiero, que pediu a um ourives que fizesse uma coroa de ouro maciço para oferecer aos deuses. Quando a coroa ficou pronta, o rei desconfiou que o ourives tinha misturado prata com ouro para aumentar o peso da coroa, sem o seu conhecimento.

O rei Hiero não tinha certeza de como confirmar suas suspeitas, então pediu a ajuda de Arquimedes que pensou por um tempo. Um dia, os escravos o levaram para os banhos públicos, e ele notou que a água se deslocava para fora da banheira à medida que ele entrava. Então, de repente ele teve uma ideia de como poderia resolver o problema e esquecendo-se de tudo, até mesmo de se vestir, saiu correndo da casa de banhos a caminho de casa, gritando “eureka, eureka!”, que em grego quer dizer descobri.

Assim, levou-o a entender que o volume de um objeto pode ser medido pelo deslocamento de líquido que ele causa. Ele, então, percebeu que poderia usar essa ideia para determinar se a coroa do rei era feita de ouro puro ou não. Arquimedes imergiu a coroa em água e mediu o deslocamento de líquido que ela causou. Em seguida, imergiu um pedaço de ouro puro com o mesmo peso da coroa e mediu o deslocamento de líquido causado por ele.

Consequentemente, Arquimedes descobriu que a coroa do rei deslocava mais água do que o ouro puro, o que significava que ela tinha um volume maior para o mesmo peso. Isso indicava que o ourives havia misturado prata com ouro para aumentar o peso da coroa. Assim, Arquimedes provou que a coroa não era feita de ouro puro, e o ourives foi punido.

Mesmo Arquimedes se dedicando a alguns trabalhos ligados um pouco a física e a aplicação concreta, como hidrostática, corpos flutuantes, mecânica, sua paixão estava na matemática e não aquela apenas aplicada, mas sim que usava o raciocínio puro e a imaginação. Ele gostava do conhecimento em si e considerava que “nada era tão perfeito como uma ideia que pudesse ser demonstrada racionalmente do começo ao fim”. (BENDICK, 2006, p. 54)

Uma de suas obras que foi muito valorizada pelos matemáticos posteriores foi “A quadratura da parábola”. Esse trabalho é um tratado matemático no qual ele apresenta um método para calcular a área de um segmento de parábola e é uma das primeiras aplicações de cálculo integral na história. Na obra, ele estabelece uma relação entre a área do segmento de parábola e a área de um triângulo retângulo, além de demonstrar que a área da parábola é igual a 4/3 da área de um triângulo inscrito na mesma.

Para realizar esses cálculos, Arquimedes utiliza um método geométrico de exaustão, que consiste em dividir a figura em partes menores, cujas áreas podem ser calculadas com precisão cada vez maiores e além disso também utilizou uma demonstração mecânica com atualização da ideia de alavanca. Esse método é considerado um precursor do cálculo integral e foi fundamental para o desenvolvimento da geometria e da matemática como um todo. Para entender mais um pouco sobre essa obra, pode-se consultar a referência (4).

Além disso, contribuiu para encontrar uma aproximação do valor de 𝝅. Lembrando que na época o sistema decimal não tinha sido criado. Isso ocorreu quando Arquimedes decidiu escrever uma correspondência para Dositeu de Pelúsio, um aluno de Conon de Samos, sobre a área do círculo e suas descobertas. Antes determinavam a área do círculo calculando a área do quadrado interno e do quadrado externo e em seguida faziam as médias das áreas quadrados.

Mas, como Arquimedes queria uma medida mais precisa, decidiu ir adicionando cada vez mais lados aos quadrados iniciais e atingiu dois polígonos de 96 lados. Assim, provou que a área da circunferência encontrada por meio do polígono de 96 lados era proporcional ao seu diâmetro numa razão entre 223/71 e 22/70 (entre aproximadamente 3,1408 e 3,1429), ou seja, uma aproximação para 𝝅, que é exatamente a razão entre a circunferência de um círculo e seu diâmetro. Para completar, mostrou que a razão entre a área de um círculo e o quadrado formado a partir de seu diâmetro é sempre constante e igual a 11/14. (BENDICK, 2006)

Dentre suas contribuições na matemática, a que Arquimedes considerava mais importante na sua vida foi o estudo do cilindro e da esfera. Atrelado a isso, escreveu também sobre as áreas e volumes dos cones, pirâmides e todas as figuras sólidas que estavam relacionadas. Mas, sua descoberta favorita estava relacionada a uma esfera contida num cilindro com altura sendo o diâmetro da esfera e a base o maior círculo da esfera. Arquimedes provou que o volume e a área da superfície da esfera são dois terços do cilindro circunscrito. Além disso, por ser um resultado do qual ele tinha um grande orgulho, desejou que a figura fosse gravada no seu túmulo. Mais detalhes sobre essa descoberta na referência (1).

Figura 3. Construção do túmulo de Arquimedes.
Fonte: https://www.geocities.ws/jaymeprof/tg/Arquimedes/foto_arquimedes.html

Além dos inúmeros assuntos citados, Arquimedes também desenvolveu obras nas áreas de aritmética e desafios para os sábios da época como “o problema do gado”. Este enigma traz consigo uma situação da Análise Diofantina, que se refere ao estudo de equações polinomiais com soluções inteiras. A questão em pauta requer calcular a quantidade de animais bovinos em um rebanho associado ao Deus do Sol, com base em um conjunto específico de condições e restrições. Também abordou e ampliou o estudo sobre espirais e até trabalhou com um quebra-cabeça de corte e montagem similar a um tangram que pode ser um exemplo de problema de combinatória antigo, abordado na obra chamada Stomachion.

Entretanto, vale destacar que de acordo com Ávila (1986), como Arquimedes enviava cartas para Alexandria, onde eram publicadas em rolos de papiros pelos matemáticos da biblioteca, infelizmente, muitos trabalhos de Arquimedes foram possivelmente perdidos durante os vários ataques que sofreu a biblioteca de Alexandria, juntamente com muitas outras obras valiosas, representando uma grande perda na história da humanidade.

Já não bastava as inúmeras contribuições para a ciência, Arquimedes, para muitos historiadores, também se tornou um mestre da guerra. Ficou conhecido assim, quando os romanos declararam guerra a Siracusa, por romperem as alianças que tinham. Durante a guerra, Arquimedes atuava na segurança da cidade com suas máquinas de destruir embarcações, construídas com base em seus conhecimentos em matemática e física. Ele era responsável pela defesa fluvial e terrestre da cidade. As máquinas de Arquimedes eram extremamente eficientes e destruíam as embarcações inimigas com garras mecânicas.

Nesse contexto, alguns historiadores acreditam que Arquimedes utilizou dos raios solares e da reflexão da luz em espelhos parabólicos para queimar embarcações durante os conflitos, máquina que ficou conhecido como “raios da morte”. Abaixo à direita está uma imagem de uma pintura intrigante localizada na parede da galeria degli Uffizi em Florença, que retrata o raio da morte, que poderia ser a arma mais sinistra de Arquimedes.

Durante a Segunda Guerra Púnica, a cidade foi cercada pelas forças romanas, lideradas pelo General Cláudio Marcellus, durante 2 anos. A captura de Siracusa ocorreu quando as defesas da cidade falharam durante a semana festiva de homenagem à Deusa da Caça Diana.

Foi nessa invasão que o General Marcellus ordenou que um soldado trouxesse Arquimedes para que o conhecesse. Entretanto, ao chegar na casa de Arquimedes, este que estava trabalhando em um problema matemático não seguiu as ordens e chegou a dizer coisas do tipo “não perturbe meus círculos” ou “Ei camarada, afaste-se de meu diagrama”, levando ao soldado, lívido de raiva, matá-lo. Posteriormente, Marcellus ressentido, prestou-lhe as honras e sobre o seu túmulo gravou a esfera e o círculo, que Arquimedes considerava o estudo mais importante da sua vida.

Figura 4. Morte de Arquimedes.
Fonte: https://www.meisterdrucke.pt/

Por fim, os estudos de Arquimedes se tornaram uma porta para a ciência, permitindo que os grandes matemáticos modernos tivessem conhecimento e provas fornecidas por vários matemáticos que os antecederam. Nesse sentido, Jeanne Bendick (2006) relata: “Um famoso cientista disse que conseguia ver tão longe por apoiar-se em ombros de gigantes. Arquimedes foi um desses gigantes-um dos primeiros”.

REFERÊNCIAS:

(1) ÁVILA, Geraldo. Arquimedes, a esfera e o cilindro. Revista do Professor de Matemática, n. 10, 1986.

(2) ÁVILA, G. S. S. Arquimedes, o rigor e o método. Revista do Professor de Matemática, 1986.

(3) BENDICK, Jeanne. Arquimedes: uma porta para a ciência. Odysseus, 2002.

(4) MOHNSAM, Julio Cesar. As contribuições de Arquimedes para o cálculo de áreas. 2014. 86f. 2014. Tese de Doutorado. Dissertação (mestrado)–Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional-PROFMAT, Instituto de Matemática, Estatística e Física, Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande.

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